Conciliação, Mediação, Arbitragem ou Judiciário: qual o caminho?

 
Nathalia Mazzonetto
No cenário empresarial, em particular nas relações e transações internacionais, mais e mais os chamados “meios alternativos” de resolução de conflitos têm ganhado destaque. Alternativos porque, em um primeiro momento, foram concebidos como saídas alternativas ao Poder Judiciário, mas hoje a expressão que melhor se encaixa para defini-los é meios adequados de solução de conflitos, na medida em que várias são as vias de acesso à justiça, não sendo a Justiça Estatal a única delas, tampouco sempre a mais adequada para solucionar uma controvérsia.
Foi Frank E. Sander um dos grandes expoentes e precursores no estudo do chamado fórum multiportas (multidoors system) para traduzir a ideia de que inúmeras são as vias de solução de conflitos, figurando a justiça estatal como apenas uma dentre elas. Nesse contexto que surgem, então, programas e métodos de pacificação social que se encontram tanto integrados, quanto externos ao sistema de justiça estatal, dentre os quais destacamos a conciliação, a mediação, a arbitragem e o próprio contencioso judicial.
A conciliação e a mediação caracterizam-se por ser métodos autocompositivos de solução de conflitos, ou seja, em que as próprias partes tomam as rédeas da situação e encontram as possíveis soluções para a disputa que as envolve. Numa e noutra normalmente há um terceiro isento e imparcial que somente auxilia as partes a identificar e acordar a melhor solução. Trata-se das figuras do conciliador e do mediador que, de regra, são profissionais com formação especializada e dotados de técnicas que ajudam as partes na busca dos seus reais interesses e na formalização de um acordo criativo, que contemple os desejos de ambas, resultando num ganho substancial de todos os envolvidos.
Já a arbitragem e o contencioso judicial apresentam-se como formas heterocompositivas ou adjudicatórias de solução de conflitos, na medida em que um terceiro, ora eleito pelas partes (no caso do árbitro), ora indicado conforme as regras legais de competência (no caso do magistrado estatal), impõe sua decisão às partes, não participando estas diretamente de sua formação, senão apenas na instrução da causa (v.g. produção de provas para influenciar no convencimento do juiz). Daí porque se costuma afirmar que a conciliação e a mediação, por serem métodos consensuais, tendem a surtir mais efeitos no adimplemento da obrigação, já que foram as próprias partes que elegeram a solução para o caso, e não um terceiro estranho e alheio à realidade delas.
Nesse ponto, cumpre-nos voltar à discussão inicial da adequação do meio de resolução de conflitos eleito. A depender do tipo de conflito que envolve as partes um ou outro se mostrará mais eficaz. É certo que custos, tempo de duração, manutenção do bom relacionamento das partes, que muitas vezes continuam a empreender negócios em conjunto, preservação do sigilo e da intimidade das partes são aspectos que devem ser sopesados.
Outro aspecto que também há de ser considerado é a especialização dos profissionais. Hoje os assuntos de uma disputa não se resumem tão somente a ações de despejo, ações possessórias ou petitórias, anulatórias e outras de teor mais simplificado, mas sim envolvem discussões com uma gama infinita de sujeitos e temas dos mais complexos, dentre os quais destacamos questões envolvendo direito marítimo, direito aeronáutico, tratados e convenções internacionais, que exigem muito mais tanto dos advogados, que auxiliarão as partes, como dos próprios terceiros imparciais que ora auxiliarão no encontro de uma solução, ora apreciarão o deslinde da causa. E, nesse ponto, com o devido respeito, os juízes estatais encontram-se (não todos, faz-se a ressalva) em grande desvantagem, seja em razão da carga de trabalho, seja em razão do fato de adotarmos um sistema que privilegia a formação generalista do magistrado, deixando-o totalmente alheio a realidades que envolvem conhecimentos mais especializados e técnicos e constituem o nosso atual cenário empresarial.
Por fim, outro ponto que não pode ser deixado de lado é a inevitável internacionalização das relações e transações, ainda mais num período que antecipa a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos.
Neste contexto, em especial a mediação e a arbitragem apresentam-se como meios de resolução de conflitos que gozam de grandes vantagens, na medida em que permitem que partes das mais variadas nacionalidades se relacionem sem se sujeitarem aos inconvenientes típicos da jurisdição estatal de um país estrangeiro, aos regionalismos, às dúvidas quanto à neutralidade dos órgãos estatais; e que, com a escolha de suas próprias regras – como, por exemplo, os Princípios – fujam das incertezas do resultado da utilização das regras de conflito de uma determinada lei nacional, vislumbrem sua relação jurídica regida por regras materiais de fonte internacional, desnacionalizando-a por completo, sem prejuízo da possibilidade de escolha da língua e da observância dos próprios usos e costumes locais, dentre outras vantagens.
Com relação à questão particular da língua e da cultura envolvidos num conflito que tem por partes pessoas de variadas nacionalidades, vale partilhar que, no mês de maio deste ano, a International Trademark Association (INTA) promoveu um Treinamento Avançado de Mediação, em congresso mundial voltado para o Direito Marcário, em São Francisco (EUA). Foram três dias inteiros de prática e simulações, que contaram com a participação de aproximadamente 40 (quarenta) profissionais, a sua maioria da carreira jurídica, de vários países, dentre eles Alemanha, Arábia Saudita, México, Canadá, EUA, Inglaterra e Brasil.
Esse evento denota a importância e maior frequência com que os métodos não tradicionais, como a mediação, vêm sendo utilizados para a resolução de conflitos.
O que ali se verificou de muito interessante é que, muito embora o inglês seja o idioma oficial para a grande maioria das negociações, em muitos momentos os participantes do grupo se depararam com dificuldades no emprego dessa língua e na interpretação de termos próprios dela e da própria cultura norte-americana. Ainda que a grande parte dos interlocutores fosse fluente no inglês, o que se observou é que em cada cultura uma palavra tem a conotação própria do povo que a utiliza. Disso resultou que uma palavra escolhida e pronunciada em inglês por um alemão, por exemplo, mostrou-se mais forte do que aquela empregada comumente pelos americanos e isso é passível de gerar desconfortos indesejáveis numa mediação.
E, para solucionar a questão, não basta o recurso a um tradutor ou intérprete, pois estes, ao trazerem a palavra para um determinado idioma, apesar do esforço, não fogem de nela embutir valores, valores estes que nem sempre podem corresponder aos valores daquele que a proferiu. E esse resultado, por si só, já é capaz de dar azo a mais discussão, num espaço que, idealmente, foi almejado para ser palco de apaziguamento.
Isso tudo para dizer que, num cenário internacional, mais e mais a cultura e o idioma terão que ser bem conhecidos, porque somente se dominando bem a audiência para quem se fala e as línguas em que ela se expressa, mais factível e viável será a missão de pacificar, empreendida ora pelo árbitro, ora pelo mediador, em especial por este, que tem o dever de conhecer também do universo emocional que circunda os sujeitos em conflito.
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Nathalia Mazzonetto é bacharel em Direito pela PUC/SP, especialista em Direito Processual Civil e Arbitragem pela Università degli Studi di Milano (Itália) e em Direito da Propriedade Intelectual pela GVLaw/SP, mestranda em Direito Processual pela Universidade de São Paulo (USP), com o fomento e apoio da Fundação de Amparo e Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), associada do Comitê Brasileiro de Arbitragem – CBAr, membro da Associação Brasileira da Propriedade Intelectual – ABPI e advogada.
 
Fonte: Direitoaoponto.com.br

 

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